Só aqui notícias

PAINEL: Migração de votos I – Prefeito: ‘O Melhor Trabalho do Mundo’

Prefeito: ‘O Melhor Trabalho do Mundo’

Timóteo já teve três bons prefeitos com o nome de Geraldo: o Ribeiro, o Nascimento e o Hilário. Trabalhei para os três, em campanhas eleitorais distintas. Indiscutivelmente, o Nascimento era o mais emblemático. Em seu primeiro mandato (1989-1992), principalmente foi um verdadeiro ‘canteiro de obras’ pela cidade, construindo em pouco tempo diversos equipamentos públicos.

Mas aonde eu quero chegar se a minha proposta do artigo é analisar ‘transferência de votos’ de prefeito bem avaliado? De Geraldo em Geraldo, acabei usufruindo de algumas experiências, aprendizados e conclusões em campanhas eleitorais. Timóteo é um case de que nada adianta um governo muito bem avaliado se a escolha do candidato sucessor não for adequada. Recomenda-se analisar uma série de fatores, sobretudo avaliar se o político tem entusiasmo em ser prefeito. Esse é o primeiro passo.

No caso de Nascimento, com taxa de aprovação superior a 80%, por força de prévia partidária no PT, ele acabou tendo que engolir goela abaixo a candidatura de então seu vice, Perácio Bicalho: um sujeito íntegro, fiel, religioso, culto, espirituoso e com carreira exemplar como servidor número 1 da PMT, além de ser carismático – embora alguns possam discordar.

Igualmente de excelente oratória, mas na campanha deixava a deseja por falta de um ‘envolvimento’ maior com a causa, ao ponto de, precisamente às 12h, em meio a qualquer atividade de visitas e/ou reuniões políticas, bater no relógio de pulso e dizer: ‘Dona maria me espera lá em casa’, referindo-se à esposa, aguardando pelo almoço familiar. Era metódico ao extremo. Sua campanha de rua era encerrada pontualmente às 17h. Podemos não concordar, mas era o jeito dele.

Ainda que o erro pela escolha de Perácio não tenha sido diretamente atribuído a Geraldo Nascimento, mas a uma elevada taxa de aprovação popular, o PT reunia plenas condições de fazer eleger outro petista na época.

No entanto, acabou perdendo com enorme margem de diferença a ‘eleição ganha’ para Leonardo Rodrigues Lelé da Cunha, por outras razões igualmente relevantes. Mais dinâmico e envolvente, Lelé já tinha sido prefeito antes.

Mas onde o PT errou? Eis a questão! Lendo o artigo, ‘Desafios extraordinários exigem candidatos extraordinários’, escrito por Mauro Calliari, administrador de empresas, penso que Perácio Bicalho nunca teve apego pelo cargo que poderia ocupar. Jamais se deslumbrou pela possibilidade de ser prefeito de uma poderosa cidade mineira.

Talvez um dos maiores equívocos dos filiados do PT naquela época tenha sido escolher justamente um candidato que carecia de entusiasmo, apesar de possuir muitas qualidades, como honestidade e passado ilibado. É verdade que Perácio Bicalho foi o menos culpado, uma vez que não moveu uma palha para se tornar candidato.

No artigo, Calliari descreve algumas características para a pretensão de ser candidato a prefeito. Uma tem a ver com o case de Perácio, cujo subtítulo é ‘Gostar de ser prefeito’. Calliari lembrou que o ex-prefeito de Filadélfia, Michael Nutter, escreveu há alguns anos um livro, ‘O Melhor Trabalho do Mundo’, sobre o desafio de ser prefeito.

‘Gostaria de ver alguém que gostasse tanto de ser prefeito que isso fosse um objetivo em si, não um passo para outros voos na política’, sentenciou Calliari, perguntando: ‘É muito?’ Ele mesmo responde: ‘Claro que é, mas por que não exigir das cidades, sob seu passado e a importância que cada uma tem, para uma liderança que trafegue pelos problemas pequenos e os grandes, catalisando as forças da cidade em direção a um objetivo comum e, que, paradoxalmente, se abra para as diferenças.’

A menos de um ano das eleições vamos escolher os prefeitos, o cargo que tem maior impacto direto na nossa vida cotidiana. Inobstante, ao pensar em ser candidato, o político deve gostar do ‘melhor trabalho do mundo’, como sentencia Nutter.

Na mesma linha de raciocínio, outro famoso livro, ‘If Mayors Ruled the World’, que traduzindo para o português significa ‘Se os prefeitos governassem o mundo’, o analista político Benjamin Barber expôs a importância dos prefeitos. Ao contrário de presidentes, obrigados a construir narrativas, os prefeitos têm a obrigação de serem pragmáticos e resolver problemas locais e imediatos.

Benjamin Barber é cirúrgico quando escreve que ‘as grandes discussões ideológicas que levam à cisão no nível nacional perdem força diante dos desafios cotidianos das cidades: garantir que os passageiros embarquem nos ônibus, as crianças tenham aulas e que a água chegue às torneiras’. É um desafio ser prefeito, pois este tem de lidar cotidianamente com a desigualdade e falta de verbas.

Além da característica de ‘gostar de ser prefeito’, Calliari lista outros fatores que despertam atenção. Um deles é de ‘não ter pudor em manter bons projetos, ainda que criados por gestões anteriores, sejam as ciclovias, sejam os projetos de reurbanização de favelas, nem medo de começar algo que vá além de seu mandato’.

Outro critério interessante refletido é de ‘ter laços sensoriais com a cidade’. Embora possa parecer óbvio, é difícil imaginar alguém capaz de compreender verdadeiramente uma cidade sem frequentar as ruas, praças, campos de futebol, feiras livres, bares (inclusive o ‘copo sujo’), escolas, igrejas e outros espaços públicos. Alguém que não ande a pé até a padaria ou conheça a história de cada bairro, que nunca tenha ‘pegado’ um ônibus para visitar um parente ou amigo. Um candidato que não sente e respira a cidade não merece o ‘melhor trabalho do mundo’. E, por tabela, dificilmente se tornará um bom gestor.

Portanto, antes de indicarmos um candidato a prefeito, inicialmente, devemos avaliar se o sujeito possui verdadeiro entusiasmo para ocupar a cadeira do ‘melhor trabalho do mundo’, algo que nunca demonstrou o carismático amigo Perácio Bicalho, com quem tenho enorme apreço e admiração.

Já na contramão de Bicalho, o ex-prefeito Nascimento sempre foi obcecado pelo cargo com fortes laços sensoriais com a cidade. Não à toa que ia aos quatro cantos do município, muitas das vezes a pé ou de ônibus. Aliás, quem usa o transporte coletivo passa a ter outro olhar da cidade.

(*) Edmílson Firmino de Souza, pesquisador da Tabulare Pesquisa & Consultoria e estrategista eleitoral, autor do Atlas Pensar Vale do Aço.

(31)9.9542-9271

Compartilhar

Divulgue seu negócio conosco