STF decide que plataformas podem ser responsabilizadas por conteúdo ilícito, mesmo sem ordem judicial

O Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu, por maioria de votos, que as plataformas digitais podem ser responsabilizadas por conteúdo ilegal publicado por usuários, ainda que não exista decisão judicial determinando a remoção. A exceção são os crimes contra a honra, que continuam dependendo de ordem da Justiça, conforme o voto do ministro Luís Roberto Barroso.

Por 8 votos a 3, os ministros consideraram parcialmente inconstitucional o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que exigia decisão judicial específica para que plataformas fossem responsabilizadas por publicações de terceiros. Com isso, ficou decidido que esse trecho da lei precisará ser reformulado.

O julgamento, que retornou no dia 4 de junho com o voto do ministro André Mendonça, exigiu seis sessões para ser concluído. Na sessão final, realizada nesta quinta-feira (26/6), já havia maioria pela responsabilização das plataformas, mas ainda sem definição clara dos parâmetros. A definição final foi precedida por um almoço entre os ministros, a convite do presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, no qual o assunto foi debatido.

O último voto foi proferido por Nunes Marques, que se manifestou a favor da constitucionalidade do artigo 19, consolidando o placar de 8 a 3. Na sequência, o ministro Dias Toffoli, relator de um dos recursos julgados, leu a tese que foi fixada.

Tese definida pelo STF:

  • O artigo 19 da Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet), que exige ordem judicial específica para responsabilização civil de provedores de aplicações por danos causados por terceiros, é parcialmente inconstitucional. Segundo o STF, a norma geral não oferece proteção suficiente a direitos fundamentais e à democracia.
  • Até que nova legislação seja aprovada, o artigo 19 deve ser interpretado no sentido de que as plataformas podem ser civilmente responsabilizadas por danos decorrentes de conteúdos ilícitos gerados por terceiros, excetuando-se os casos cobertos por regras eleitorais ou normas do TSE.
  • As plataformas serão responsabilizadas com base no artigo 21 do Marco Civil nos casos de crimes ou outros atos ilícitos, incluindo situações em que contas são denunciadas como inautênticas, sem prejuízo da obrigação de remover o conteúdo.
  • Para crimes contra a honra, permanece válida a exigência de decisão judicial conforme o artigo 19, embora a remoção possa ser solicitada por notificação extrajudicial.
  • Quando houver replicações de conteúdo ofensivo já reconhecido judicialmente, todas as plataformas devem retirar as publicações similares, mesmo sem nova decisão judicial, desde que notificadas judicial ou extrajudicialmente.
  • Provedores que operam no Brasil devem manter sede e representação legal no país. Essa representação, exercida por pessoa jurídica, deve ter plenos poderes para atuar judicial e administrativamente, prestar informações sobre moderação de conteúdo e regras internas, cumprir decisões judiciais, emitir relatórios de transparência, monitorar riscos sistêmicos, e ser responsável por eventuais penalizações e sanções.

Serviços de mensagens privadas continuam sob regra atual

Aplicações como e-mails, WhatsApp, Telegram e plataformas voltadas para comunicação privada continuam sujeitas ao que estabelece o artigo 19. Isso se aplica especificamente a:

  • Provedores de e-mail;
  • Plataformas cuja função principal seja realizar reuniões privadas por voz ou vídeo;
  • Aplicações de mensageria instantânea voltadas a comunicações pessoais, protegidas por sigilo, conforme o artigo 5º, inciso XII da Constituição Federal.

Novas obrigações para as plataformas

Além disso, o STF determinou que os provedores desenvolvam mecanismos de autorregulação, incluindo:

  • Sistema de notificações e devida tramitação processual;
  • Relatórios anuais de transparência sobre notificações extrajudiciais, anúncios e impulsionamentos;
  • Canais permanentes de atendimento acessíveis a usuários e não usuários, preferencialmente eletrônicos, amplamente divulgados nas plataformas.

Essas regras deverão ser públicas, revisadas regularmente e acessíveis à sociedade.

Aplicação da decisão

A decisão tem repercussão geral, o que significa que deve ser aplicada a todos os casos semelhantes no Judiciário brasileiro. O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, destacou que o Tribunal não está legislando, mas apenas decidindo dois casos específicos com efeitos amplos enquanto o Congresso não legisla sobre o tema:

“O Tribunal não está legislando. Está decidindo dois casos concretos que surgiram. Está decidindo critérios até que o Legislativo defina critérios sobre essa questão.”

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